Com a palavra, os indígenas Ni Krenak, Laurinda Gonçalves, Adailton Xakriabá e as lideranças Célia Kakriabá e Ailton Krenak

 

Quem são os indígenas de Minas?

O Tempo visitou os territórios Xakriabá, Krenak e Maxakali em Minas | Foto: Flávio Tavares/O TEMPO

 

Eles já estavam aqui muito antes de 1500 e, desde então, precisam lutar pelas próprias terras e pela manutenção de tradições. Uma resistência ininterrupta, que até hoje exige constantes batalhas não apenas territoriais, mas contra o apagamento secular da memória e a violação de direitos básicos. Também precisam enfrentar a ignorância de quem ainda questiona: “uai, tem indígena em Minas?”. Tem indígena em Minas, sim! São cerca de 20 etnias e, com base no último Censo oficialmente divulgado pelo IBGE (2010), quase 4% dos indígenas do Brasil estão no Estado.

Ní Krenak
Ativista indígena

“Quando eu morava em Belo Horizonte, andava com meus meninos no shopping e nos perguntavam se éramos indianos ou da Amazônia, mas nunca de Minas Gerais. Eu sempre dizia: ‘Somos indígenas de Minas Gerais’. As pessoas cavam surpresas: ‘mas em Minas tem indígenas? Quem são vocês?’. ‘Somos os Krenak de Minas Gerais’, eu falava com muito orgulho. Era um absurdo ouvir que em Minas não
tem indígenas. Temos nossa língua, nossa cultura, sabemos cantar e dançar, mas não vamos fazer isso todo dia e toda hora. Temos nossos dias sagrados, temos nossos sonhos. Meus filhos foram registrados com nomes indígenas, é importante fazer isso para mostrarmos que tem indígena em Minas. Não é porque tenho carro, moro numa casa, estudo, faço faculdade e uso roupa que não sou indígena. Ser indígena está no sangue, na alma. Minha alma é indígena, meu sangue é indígena, meu pensamento é indígena, minha luta é indígena. Em Minas tem indígena, sim! Está no sangue, na alma e no pensamento.”

 

Laurinda Gonçalves de Souza
Professora de cultura indígena da Aldeia Caraíbas, Xakriabá

“Tem indígena em Minas, sim. Nós somos um povo originário que busca o reconhecimento e queremos que as pessoas conheçam nossa cultura, porque para muita gente os indígenas não têm valor, mas somos valorosos. Queremos mostrar que a gente existe, a gente está vivo. E somos 37 aldeias aqui dentro do
território Xakriabá.”

 

Adailton Xakriabá
Presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena (MG/ES)

 

“Tem indígena em Minas Gerais, sim. Nós somos os verdadeiros originários desta terra. A mensagem que eu deixo para o Brasil e para todos é que nós somos um deles. Nascemos índios e vamos morrer índios, para que todos fiquem sabendo.”

 

Célia Xakriabá
Deputada federal pelo Psol-MG, primeira mulher indígena mineira nesse cargo

 

“Entrei na escola indígena em 1996, quando os primeiros professores indígenas de Minas assumiram. Quando se discutia, em 1996, a presença indígena no Estado, saiu uma revista que dizia: ‘Uai, tem índio em Minas?’. Hoje, mudando esse termo, respondo: ‘Uai, temos, sim, povos indígenas em Minas Gerais’. Existe uma diversidade grande de povos indígenas por aqui. Tem o povo Maxakali, que na década de 40 foi quase exterminado. Existe o povo Krenak, que foi importante não só para Minas, mas para o Brasil. Na ditadura militar, existiu um reformatório no território Krenak – um campo de concentração. Milhares de indígenas foram torturados e mortos na ditadura. Essa terra indígena é guardiã de uma história que reflete a presença indígena do Brasil. Há o povo Xakriabá, o maior povo indígena no Estado, com população em torno de 12 mil. Há o povo Xukuru, que veio de outros Estados. Existe o povo Pataxó, o povo Pankararu. Essa diversidade está no contexto urbano. Quando a gente ouve: ‘Por que os povos indígenas estão chegando até aqui?’, na verdade, foram as cidades que chegaram até os territórios indígenas. É importante reconhecer essa diversidade. Tem indígena em todos os biomas. Minas é bioma Mata Atlântica. Minas é Cerrado. Minas é Caatin- ga. Mas tem indígena no Pampa, no Pantanal.”

 

 

Ailton Krenak
Escritor, poeta, líder indígena, ativista ambiental e membro da Academia Mineira de Letras

 

“Na década de 1990, quando a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e alguns pesquisadores da instituição, junto com pessoas da Secretaria de Estado da Educação, se propuseram a criar um programa de implantação da educação escolar indígena em Minas Gerais, a pergunta que se escutava era: ‘Uai, tem índio em Minas?’. De 1996, 1997 para cá, ela foi respondida de uma maneira tão retumbante que elegemos uma mulher indígena com mais de 100 mil votos para o Congresso Nacional. Elegemos prefeitos para municípios, que trazem reconhecimento à presença indígena no Estado. O povo Maxakali está tendo filmes premiados em festivais no Canadá e nos Estados Unidos, filmes feitos pelo Isael e pela Sueli Maxakali; os livros publicados por eles são lidos nas universidades e nas bibliotecas. Houve um renascimento indígena em Minas Gerais, de fato, com a presença de mais de dez etnias, uma espécie de explosão indígena, porque historicamente em Minas tem os Krenak, que são os filhos dos antigos Botocudos do rio Doce. Tem Maxakali, nossos parentes da região do Vale do Mucuri, que também já habitaram outras regiões, e os Xakriabá, no Norte do Estado.”

 

 

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