PM e “seguranças” da mineradora Vale realizam operações de intimidação contra indígenas em área com despejo marcado para o final deste mês

Membros da aldeia Kamakã Mongoió,  em Brumadinho (MG), denunciam que na manhã desta sexta-feira (18) seu território teve a presença de carros da Polícia Militar e da mineradora Vale S.A. pela segunda vez em duas semanas. Segundo o cacique  Merong Kamakã, a presença de forças de repressão do Estado, através da Polícia Militar, e de seguranças da mineradora Vale é uma ameaça constante desde o dia 05 de março, quando a comunidade recebeu a primeira de duas ordens de despejo. No dia 05, a PM foi ao local para assegurar a retirada imediata das famílias indígenas.

A Juíza Renata Nascimento Borges, autora da ordem, na Comarca de Brumadinho, decidiu a favor da ação movida pela mineradora Vale, empresa privatizada no primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso, em 1997, em parceria com Eduardo Azeredo no governo mineiro, ambos do PSDB. No dia 18, receberam a segunda ordem de despejo entregue por oficial de justiça, acompanhado pelas forças da PM e de seguranças. A segunda ordem de reintegração de posse e despejo tem  até dia 26/03 para a retirada dos moradores da área que é reivindicada pela empresa.

A aldeia Kamakã-Mongoió é resultado de uma retomada feita pelos indígenas das etnias Puri e Kambiwá em outubro de 2021. Em março de 2022, foram despejados. Tal despejo, porém, pode ser inconstitucional, de acordo com a advogada Lethicia Reis, do Conselho Indigenista Missionário (CIMI). Ela afirma que uma liminar do ministro Luís Roberto Barroso, em vigor desde dezembro de 2021, proíbe despejos até o dia 31/03/2022.

Outro impedimento para esta ordem de despejo são a determinação do Ministro Edson Fachin, de maio de 2020, especificamente para as comunidades indígenas, que estabelece a proibição de processos de despejo e de reintegração de posse até o fim da pandemia ou até que as ações judiciais envolvendo questões de terras indígenas sejam julgados na esfera federal. O próprio Fachin é relator desses processos, em tramitação.

Além disso, outro problema  relativo à constitucionalidade desta ordem, emitida pela juíza de Brumadinho é que, por ter indígenas envolvidos, a FUNAI, constitucionalmente, tem o dever de representá-los e defendê-los, em esfera federal, e não estadual, como ocorreu. A FUNAI, porém, não se manifestou sobre o assunto.

Depois do criminoso vazamento de barragem da Vale privatizada, de todo o sofrimento, da destruição de vidas, de casas e aldeias, de lavouras e do meio ambiente na região, a população  das cidades e das aldeias indígenas de Brumadinho, como os indígenas das etnias Puri e Kambiwá ficaram desalojados, sem fonte de água limpa, alimento, e, nesse sentido, dignidade. Agora, outro tipo de perseguição violenta por parte da mineradora tem como objetivo tirá-los de sua terra.

Trata-se de ações parciais e claramente tendenciosas dos poderes judiciário e político, apoiadas pelas forças de repressão policial, que garante que o poder econômico e seus interesses nefastos prevaleçam sobre quaisquer obstáculos que se coloquem a tal objetivo. Depois de destruírem e venderem as montanhas e tudo que havia em seu interior, a multinacional da mineração, que ainda não pagou as indenizações que deve à população atingida de maneira integral, coloca a Polícia Militar para afastar de forma violenta os despossuídos que eles mesmos criaram com sua exploração violenta.

Se não saírem pelas mãos da lei, sairão pelas balas dos PMs. O capital empresarial precisa da força policial para se garantir no gozo de seu poder.

A PM é chamada por empresários em MG – ou em qualquer outro estado – para garantir o cumprimento de leis estaduais em detrimento de leis federais, que aparentemente protegem a população indígena, mas que sem o braço armado da PM não  se implementaram. E fica por isso mesmo. A Lei e a Constituição estão acessíveis como textos e peças de retórica. Mas a bala, o fogo e a fumaça da PM estão bem direcionados.

Finalmente, é preciso lutar pelo fim da PM e pela criação de comitês de autodefesa das comunidades indígenas. É um elemento imprescindível para a resolução de conflitos fundiários centenários, sejam eles envolvendo indígenas sem terra ou agricultores sem terra.

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