Porto Corís

23/03/2010

 

PORTO CORÍS
 
LOCALIZAÇÃO
Situada no município de Leme do Prado, no vale do Jequitinhonha, Porto Corís foi a primeira comunidade, em Minas Gerais, a receber o certificado de remanescente de quilombo, no ano 2000, e também a primeira, a ter suas terras tituladas, pelo art. 68 do ADCT.
Mas a comunidade perdeu seu território histórico e titulado, localizado às margens do rio Jequitinhonha, devido à inundação provocada pela construção de uma barragem. Hoje ocupa outro território, na Fazenda Mandassaia, no mesmo município.
 
HISTÓRIA
A comunidade, conforme contam seus moradores, teve início com Germano Alves Coelho, filho de uma escrava fugida, que conseguiu documentar suas terras um mês antes do final da escravatura. Hoje, seus descendentes constituem a comunidade de Porto Corís.
Antigamente denominado Rancho dos Porcos, pela presença de uma criação de suínos, passou a Porto Corís por iniciativa de seus moradores. Porto em razão da existência de canoas utilizadas para a travessia do Rio Jequitinhonha e Corí por ser o termo pelo qual os filhos de Germano se auto atribuíam.
Essas terras, depois de servirem de refúgio para a mãe de Germano, escrava que fugira da fazenda do Gouveia, foram compradas pelo próprio Germano que, recapturado, trabalhava, nos domingos e dias santos, no garimpo, em uma roça própria e como artesão. Essas atividades lhe permitiram ajuntar, pouco a pouco, recursos para a compra daquela terra. Seus atuais descendentes ainda se recordam dessa história e se orgulham de seus ancestrais pela intensa capacidade de trabalho e de resistência ao regime escravo, só aceito quando “não tinha outro jeito”, que demonstraram.
 
REASSENTAMENTO
No dia 08 de junho de 2006, foi inaugurada a Usina Hidrelétrica de Irapé, no rio Jequitinhonha. Como as águas de sua barragem atingiram a comunidade, essa foi obrigada a se reassentar em um local distante do rio, na fazenda Mandassaia, área de 2.200 hectares, típica de chapadasplanas e com poucas fontes de água. Essa situação alterou completamente as formas de uso e de relação com o ambiente natural adquiridas
pelos quilombolas há mais de 100 anos. Isso aumentou as dificuldades de sobrevivência do grupo de moradores da Fazenda Mandassaia.
Parte da riqueza patrimonial foi irreversivelmente afetada com a implantação da usina no território quilombola, riqueza essa que permanece viva na memória dos quilombolas. Não há valor econômico que pague a perda de um território histórico tradicional, símbolo da resistência negra, como afirmou um morador: “- Largar onde a gente nasceu e se criou e ir para um deserto, saindo de um lugar de onde nunca saí?”
 
ECONOMIA LOCAL
Quando localizada às margens do rio Jequitinhonha, na comunidade viviam doze famílias e cerca de 65 pessoas. As casas eram de adobe, cobertas com telhas de barro e piso de cimento ou terra batida.
Na época em que os Corís viviam nas margens do rio, cultivavam produtos de subsistência, além de frutas, cana e café. Possuíam animais de grande porte para carga e montaria. Fabricavam o próprio sabão feito com pinhão ou pequi. Das matas retiravam frutos e plantas medicinais, além da madeira. O Jequitinhonha fornecia a água de irrigação e o pescado. O garimpo era uma atividade complementar à subsistência.
Parte dos moradores, geralmente jovens, deslocava-se, anualmente, para o corte da cana e a colheita do café no estado de São Paulo.
Hoje as atividades agrícolas e de pesca se alteraram radicalmente, pois se encontram longe do rio e vivem em área de chapada. Nesse local, a adaptação está difícil e estão enfrentando fracassos na lavoura, base de subsistência do grupo, que corre o risco de se dispersar.
 
CULTURA
Compartilham do sentimento de ser e pertencer a este grupo pela descendência comum do ex-escravo Germano Alves Coelho. Guardam práticas cotidianas desenvolvidas ao longo dos anos. Os casamentos se dão preferencialmente entre primos, o que é uma forma de manutenção da posse comum das terras e dos laços de solidariedade.
Para eles, ser parente é ser solidário, respeitar o direito hereditário dos demais descendentes e participar no trabalho comunitário dos mutirões. O uso do pilão, tão presente nos quilombos, os artesanatos de tecer balaio, jacá e jequi, e muitas outras práticas expressam sua identidade cultural. Os mais velhos usam o termo “roxo” para se identificarem quanto a cor da pele, pois eles não se dizem pretos: preto é cor de objeto e
não de pessoa. Também não se dizem negros: negros eram os cativos e todos ali, segundo um morador, sempre foram livres. Na região, o termo negro era adotado pelos proprietários de escravos. Atualmente, os mais jovens, entretanto, usam esse termo em um sentido positivo.
Em fins da década de 80, Adão C. de Jesus introduziu na comunidade a Congregação Cristã do Brasil. Hoje, quase todos da parentela pertencem a essa igreja. Eles orgulham-se dos seus costumes cristãos e da retidão de sua observância.
 
Fontes: CEDEFES e O’DWYER; OLIVEIRA (1997).
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