Comunidade indígena se vê ameaçada com Plano de Manejo do Parque Sete Salões; a decisão restringe a circulação dos Krenak no território

Território é reivindicado pela comunidade dos Krenak como terra indigena. (foto: Reprodução/Parque Estadual Sete Salões)

que Estadual Sete Salões, localizado na Região do Médio Rio Doce, pode prejudicar a comunidade indígena do povo Krenak. De acordo com o Instituto Terra, organização sem fins lucrativos, a elaboração do plano atual não considerou o posicionamento do povo Krenak, vizinhos do parque e que, junto aos proprietários da comunidade ao redor, são os principais interessados no parque. Com a decisão, os Krenak se vêem descartados e enfrentam restrições na circulação em parte do território.

O Parque Sete Salões tem uma área de 12.520 hectares e é considerado uma Unidade de Conservação (UC) pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), como instituído pela Lei Federal nº 9985/00, e é também um território reivindicado pelo povo Krenak como terra indígena.
O plano de manejo do parque foi aprovado na 70ª reunião da Câmara de Proteção a Biodiversidade e Áreas Protegidas do Copam (CPB) do Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam), em 22 de fevereiro.
Com a medida, os indígenas se viram excluídos da Zona de Amortecimento, isto é, das áreas localizadas no entorno da Unidade de Conservação (UC), onde as atividades passam a ser sujeitas a normas e restrições específicas, com o propósito de minimizar os impactos negativos, como é especificado pelo art. 2º da Lei Federal nº 9985/00. Dessa forma, a comunidade se vê enfrentando restrições à circulação em um território com o qual possuem relações ancestrais.
“Há uma disputa territorial muito longa, entretanto a ocupação do Vale sempre se deu pelo povo Krenak. Eles reivindicam o território como terra indígena Krenak, fica à margem direita do Parque Sete Salões e a terra indígina Krenak parcialmente demarcada fica à margem esquerda do Rio Doce”, contextualiza João Vitor de Freitas Moreira, professor de Direito na UFJF e integrante do Instituto Shirley Krenak.
Geovani Krenak, líder e representante da comunidade indígena, vereador da cidade de Resplendor, da Região do Vale do Rio Doce, conta que em nenhum momento houve diálogo com a comunidade Krenak.
“Uma situação complicada. Durante todo o processo a comunidade foi excluída dessa iniciativa do estado com relação a este Plano de Manejo. É um absurdo nos dias de hoje, mas é um fato, motivo pelo qual estamos elaborando um documento para combater essa iniciativa do estado, desse Plano de Manejo sem que a comunidade fosse informada”, pontua Geovani Krenak.
Além da revisão do Plano de Manejo, a comunidade reivindica que seus direitos sejam respeitados.
“Nós estamos pedindo uma revisão ao plano e também denunciando, porque isto é uma violação dos direitos humanos. É óbvio que qualquer assunto que envolva o povo Krenak, a gente tem que conversar sobre, mas ao mesmo tempo que nós fomos desavisados, excluídos, nós vemos uma manobra com indício de violação de direitos humanos”, complementa Geovani.
O professor de Direito João Vitor explica que há algum tempo o território é disputado, mas a situação se demonstra mais complexa: “Eles reivindicam o território, mas de qualquer maneira o território, hoje, está sob jurisdição do estado de Minas Gerais, porque se trata de uma Unidade de Conservação (UC), e que não foi adequadamente instrumentalizada e manuseada pelo IEF, e muito menos pelo parque, porque o plano de manejo, que foi aprovado, acabou sendo uma provocação do Ministério Público do Estado de Minas Gerais, que mandou-os fazer algo que devia ter sido feito há mais de 20 anos”, explica.
O estudioso acrescenta também que os direitos da comunidade estão sendo violados. “O Parque é disputado territorialmente, mas ele é terra indigena. E essa terra indigena está em processo demarcatório. A Unidade de Conservação (UC) impede a circulação de pessoas, esse plano de manejo é um plano de gestão da administração do parque. Isso não só viola a comunidade como também viola o direito territorial deles, daquela matéria indigena, que não é o parque estadual, que não é uma unidade de conservação”, ressalta. “Os interesses afloram agora por muitas razões. O povo Krenak, que ocupa aquela região, imemorialmente, reivindicam não apenas o território, mas eles foram simplesmente deixados às margens de consulta”, complementa.
De acordo com o Instituto Estadual de Florestas (IEF), o Plano de Manejo deve priorizar “a manutenção dos modos de vida tradicionais relevantes à conservação e à utilização sustentável da diversidade biológica, por meio da participação das comunidades locais”.
O representante da comunidade Krenak pretende tomar medidas contra o Plano de Manejo e garantir o direito do povo indígena. “A nossa indignação é em relação a essa violação aos direitos humanos. É mais uma vez uma manobra do estado em negar o território indigena. É um território milenar do povo Krenak, é um território sagrado do povo”, expõe.
“Se eles quisessem de alguma forma nos incluir, eles poderiam ter feito isso, nesse Plano de Manejo, mas através deste plano fica bem evidente essa manobra política do estado brasileiro em negar mais uma vez o nosso território”, desabafa.
Com o intuito de apoiar a comunidade Krenak, o Instituto Terra, que faz parte do conselho do Parque Sete Salões, enviou um ofício ao Parque Estadual solicitando uma revisão do plano de manejo e pedindo que as reivindicações do povo Krenak sejam ouvidas. Confira a nota de posicionamento na íntegra:
“O Instituto Terra vem por meio desta nota se solidarizar com o povo Krenak e recomendar ao Parque Estadual de Sete Salões uma revisão do seu plano de manejo.
 
O Instituto Terra faz parte do Conselho Consultivo do Parque Estadual de Sete Salões e participou da construção da atual versão do plano de manejo, que foi aprovado no último dia 22 de fevereiro. Dias depois, chegaram ao conhecimento do Instituto as contundentes ressalvas ao processo de elaboração do plano de manejo do Parque, apontadas pelo povo indígena Krenak.
 
Em seus quase 24 anos de atuação, o Instituto Terra sempre prezou pela conservação da mata atlântica no Vale do Rio Doce e busca manter um bom relacionamento com todos os agentes engajados nessa missão. Por isso, o Instituto vem a público afirmar que:
  • As reivindicações do povo Krenak são pertinentes e devem ser levadas em consideração por toda a sociedade, em especial as comunidades adjacentes ao seu território.
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  • A resistência do povo Krenak é fundamental para a preservação das florestas na região do Vale do Rio Doce.
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  • O plano de manejo de uma unidade de conservação é um documento vivo, passível de mudanças.
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  • A função primordial das organizações de preservação ambiental é garantir a conservação dos ecossistemas daquela área, causa com a qual as famílias indígenas Krenak também pactuam.
 
Por tudo isso e por entender que somos todos parceiros na missão de conservar os ecossistemas no Vale do Rio Doce, o Instituto Terra recomenda ao Parque Estadual de Sete Salões a revisão do atual Plano de Manejo, num processo que inclua a participação direta do povo Krenak.
Com isso, o Instituto Terra reafirma o seu compromisso de estreitar o relacionamento de agentes e comunidades que atuam na preservação ambiental.”

Tanto a administração do Parque Estadual Sete Salões quanto Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) de Minas Gerais foram procurados pela reportagem do Estado de Minas, mas até a publicação desta reportagem não obteve resposta.

* Estagiário sob supervisão da subeditora Ellen Cristie.
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