Nota de apoio aos Direitos dos Carroceiros e das Carroceiras e suas famílias – Comunidade Tradicional Perseguida em BH

16/12/2020

Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva-CEDEFES

Carroceiros no Festivale em Jequitibá, MG, em 2018, junto a lideranças de outras comunidades tradicionais contando sobre o ofício e a arte milenar de ser “Carroceiro” e o enfrentamento às perseguições e aos preconceitos nas grandes cidades. Foto: Alenice Baeta/CEDEFES.

 

O Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva- CEDEFES vem por meio desta nota externar a nossa grande indignação e preocupação com o resultado da votação ontem, dia 15 de Dezembro de 2020 na câmara de vereadores de Belo Horizonte que aprovou o Projeto de Lei 142/2017, que pretende acabar com o ofício dos carroceiros na cidade, apoiado por parte do movimento em defesa dos direitos animais. O projeto é um grave equívoco e ataque ao direito e à vida dos mais de 10.000 carroceiros da capital e região metropolitana, resultado de uma política clara de racismo estrutural e de perseguição sociocultural. Trata-se de uma categoria invisibilizada de Comunidade Tradicional, todavia, protegida pelos artigos 215 e 216 da CF/1988, pela Convenção 169 da OIT, da ONU e pelas Políticas Nacional e Estadual de Povos e Comunidades Tradicionais.

Os carroceiros e as carroceiras fazem parte da história e da vida da cidade. Além de fonte de renda, o trabalho dos carroceiros é também um modo de vida e de saber, uma forma de habitar e produzir a cidade e suas territorialidades. Os carroceiros e carrocerias são detentores de saberes tradicionais que compõem o patrimônio cultural das cidades em vários pontos do planeta. Foi a partir do trabalho na carroça junto com seus companheiros, os cavalos, que gerações de carroceiros construíram suas vidas, educaram seus filhos, construíram suas casas e contribuíram para que a cidade chegasse até aqui. Negar o direito ao trabalho aos carroceiros é negar parte importante de nossa própria história e memória ancestral.

Uma das principais alegações daqueles que votaram e defendem o PL é a existência de maus tratos contra os animais. No entanto, os próprios carroceiros tradicionais sabem da importância do cuidado e do amor aos animais, já que é com eles que ganham o pão de cada dia. Outros ainda dizem que, mesmo que não haja maus tratos, o trabalho na carroça é uma forma de exploração dos animais. Isso demonstra o caráter classista e etnocêntrico do projeto, já que pretende proibir apenas os carroceiros de trabalhar com seus cavalos, sem dizer uma só palavra sobre os cavalos de haras, fazendas ou mesmo aquele utilizados pela polícia militar. Para os carroceiros, os cavalos não são simples objetos que podem ser substituídos por motos adaptadas ou qualquer outra máquina que, aliás, vão  gerar mais poluição no ar das cidades, já tomada por gases poluentes e tóxicos.

Entre os carroceiros e cavalos as relações são de afetado e cuidado e não relações de mercado. Inclusive, uma demanda dos próprios carroceiros é justamente a fiscalização para que haja coibição de maus tratos e a garantia dos direitos, acolhimento e saúde dos animais.

O direito ao trabalho nas carroças é parte do direito a uma cidade diversa que saiba acolher e respeitar todas as formas de cultura e de natureza que nela habitam.

A Cidade é Nossa Roça! Nossa Luta é Na Carroça!

#RESISTECARROCEIROS

 

Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva-CEDEFES

Belo Horizonte, 16 de dezembro de 2020.

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