Filmes indígenas são destaque no 27º Forumdoc.bh, que começa amanhã

22/11/2023

Lucas Lanna Resende

Fonte:https://www.em.com.br/cultura/2023/11/6658966-filmes-indigenas-sao-destaque-no-27-forumdoc-bh-que-comeca-amanha.html

A partir de quinta (23/11), o festival promove a exibição gratuita de 68 títulos, nos cines Humberto Mauro e Santa Tereza; filmes de mulheres também se destacam

Cena do filme “Yvy Pyte – Coração da Terra”, de Alberto Alvares e José Cury, que será exibido na abertura do festival

Assim como uma cartografia decolonial, conforme escreveu o professor e pesquisador da Universidade Federal de Minas Gerais André Brasil, o documentário “Yvy Pyte – Coração da terra” (2023), de Alberto Alvares e José Cury, desnuda uma região na fronteira do Brasil com o Paraguai onde os povos que ali vivem não observam o limiar entre os dois países. Trata-se dos guarani-kaiowá, localizados entre Mato Grosso do Sul e Amambay, o equivalente a um estado do Paraguai.

“Para nós, não existe fronteira, essa linha imaginária”, diz Alvares, natural da aldeia Porto Lindo (MS). “Os parentes (como Alvares chama os demais guarani-kaiowá) circulam livremente tanto do lado paraguaio quanto do brasileiro.”

A região é alvo constante de assédios por parte de grileiros. E, há cerca de 40 anos, os guarani-kaiowá lutam para recuperar parte do território perdido. O conflito aparece no filme, mas de maneira subjetiva, ao lançar mão da relação de Alvares com sua terra natal e a cultura dos guarani-kaiowá.

“Yvy Pyte – Coração da terra” abre a 27ª edição do Forumdoc.bh – Festival do Filme Documentário e Etnográfico, Fórum de Antropologia e Cinema, com exibição na noite desta quinta-feira (23/11), no Cine Humberto Mauro.

A sessão de estreia indica como o festival tem se orientado pelos múltiplos olhares na produção documental no Brasil nos últimos 27 anos, dando maior visibilidade para a produção indígena, feminina, negra e de pessoas da comunidade LGBTQIA+.

Serão exibidos 68 documentários, em quatro mostras, no Cine Humberto Mauro e no MIS Cine Santa Tereza, até 3/12. O destaque fica com as mostras “A câmera é a flecha, a câmera é a cesta: Cinemas Krahô, Tupinambá, Kuikuro, Kaiabi e Guarani ” e “Experimentações feministas – Cinema, vídeo e democracia no Brasil (1970-1994)”.

DIVERSIDADE CULTURAL

“Acho que a programação mantém um tipo de desenho que foi sendo construído aos poucos nesses últimos anos, privilegiando a diversidade cultural e de identidades no cinema”, afirma o cofundador e curador do Forumdoc.bh Paulo Maia. “Ou seja, a gente não exibe apenas filmes de, vamos dizer assim, homem branco, entende? Existe uma tentativa de trazer maior variedade à programação, que percorre um pouco o caminho do cinema não convencional”, diz.

Serão exibidos filmes como “Mulheres, uma outra história” (1988), de Eunice Gutman, sobre a participação das mulheres no cenário político brasileiro no período de redemocratização; “Lesbian feminism” (1974), de Norma Bahia Pontes e Rita Moreira, sobre os preconceitos enfrentados por lésbicas negras norte-americanas na década de 1970; e “Terra para Rose” (1987), de Tetê Moraes, que joga luz na luta pela reforma agrária no Brasil da Nova República, a partir de uma ocupação.

Também estão na programação filmes indígenas, como “Ketwajê” (2023), de Mentuwajê Guardiões da Cultura (Krahô) e Coletivo Beture (Mebêngôkre-Kayapó), sobre ritual de iniciação homônimo ao filme no qual crianças se preparam para ser guerreiros da aldeia; “Thuë Pihi Kuuwi – Uma mulher pensando” (2023), de Aida Harika Yanomami, Edmar Tokorino Yanomami e Roseane Yariana Yanomami, sobre a espiritualidade dos yanomami; e o já citado “Yvy Pyte – Coração da terra”.

“Esse destaque para a produção indígena é extremamente importante, porque nos faz pensar e refletir o quanto o cinema indígena ainda passa por dificuldades”, diz José Cury, codiretor de “Yvy Pyte – Coração da terra”. “Nosso filme, por exemplo, foi feito com um orçamento baixíssimo, de R$ 240 mil. É bem menos do que custa um curta, que fica em torno de R$ 500 mil”, emenda.

O Forumdoc.bh contará ainda com as tradicionais mostras “Sessões especiais” e “Contemporânea brasileira”, que, de acordo com Maia, fazem “um panorama do que vem sendo produzido nos dois últimos anos em termos de documentário”.

São filmes das mais variadas temáticas e estéticas. Há desde “A bata do milho” (2023), de Eduardo Liron e Renata Mattar, sobre trabalhadores rurais baianos que mantêm a tradição de cantar durante o cultivo do milho; até “A Noite das Garrafadas” (2023), de Elder Gomes Barbosa, que aborda os resquícios do Brasil Império presentes na Rua da Quitanda.

Grande parte desses filmes estarão disponíveis gratuitamente no site forumdoc.org.br, onde também estará o catálogo desta edição do festival. “Ele é quase um livro, com muitos ensaios, entrevistas e informações. Já virou parte importante do festival. Esse catálogo costuma circular nos cursos de cinema e nos cursos de antropologia aqui da cidade”, diz Maia.

EXPERIÊNCIA IMERSIVA

Depois de ser exibido em Portugal e na Alemanha, “Yvy Pyte – Coração da terra” (2023), que contou com apoio do Rumos Itaú Cultural, chega ao 27º Forumdoc.bh com uma página no Instagram (@yvypyte) e um site (yvypyte.com.br) contendo infográficos com vídeos, áudios, fotos e informações das aldeias guarani-kaiowá em Mato Grosso do Sul e no Paraguai retratadas no filme. “Ele proporciona às pessoas uma experiência imersiva nesses lugares”, diz o codiretor José Cury.

27º FORUMDOC.BH
Festival do Filme Documentário e Etnográfico, Fórum de Antropologia e Cinema, a partir desta quinta-feira (23/11) até 3/12, no Cine Humberto Mauro, do Palácio das Artes (Av. Afonso Pena, 1.537, Centro), Cine Santa Tereza (Rua Estrela do Sul, 89, Santa Tereza) e no site do festival, onde toda a programação pode ser consultada. Entrada franca.

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